3.17.2006

Talismã

Parte 1 – Do início de um ciclo

Tenho uma mania que me persegue há uns três anos, quando encontro alguma coisa perdida por aí vou logo guardando na minha bolsa, claro que faço um esforço tremendo para saber se pertence a alguém, se não é de ninguém logo é meu.

Tudo começou quando eu estava saindo da faculdade num Sábado à tarde e dei por conta que tinha perdido meus óculos, procurei na sala que eu tive aula, na lanchonete e na loja de livros que eu havia estado no intervalo. Nada de óculos e o pior é que eu tinha acabado de comprar meus olhinhos de vidro como eu chamava meus óculos por vezes negligenciados, sentada já sentindo falta deles e pensando em como os substituiria, foi quando lembrei que bem escondidinha no primeiro andar do bloco H havia uma sala de achados e perdidos e se houvessem boas almas encontradoras de óculos no mundo, essas almas entregariam coisas perdidas no setor de achados e perdidos no bloco H em mãos de Dona Carmem. Num disparo cheguei à sala, mas infelizmente as almas filhasdaputa persuadiram as boas almas que um dia existiram no mundo, almas filhasdaputa não pensam em ninguém, nem mesmo que alguém pode estar sem seus olhinhos de vidro e que precisa muito deles na prova de segunda-feira. Dona Carmem disse que se lembraria de mim se alguém deixasse uma caixinha de óculos com ela, foi nesse momento que eu o vi. Um estojinho vermelho, muito do engraçadinho e bem gordinho, um vermelho que me atraia de tal forma que não foi possível resistir:

- Dona Carmem, acabo de me lembrar que na outra semana perdi um estojo vermelho, alguém deixou um estojo aqui?
- Me deixa ver – aqui esta é esse?
- É sim dona Carmem, que bom. Muito obrigada!


Sai como que triunfante da salinha, se ficaria sem meus óculos alguém ficaria sem seu estojo. Nada mais justo.

Parte 2 – Das descobertas

Coloco o estojo na minha bolsa e vou para casa. Chegando, largo minhas coisas na sala, preparo alguma coisa para comer, vejo um pouco de TV e desmaio de sono. Desperto com um susto, talvez um sonho, mas com uma vontade enorme de ver o que o estojinho vermelho guardava dentro de si.

1 Borracha com desenho de coração
2 Canetas - uma preta outra azul, esta toda mordida
1 Lapiseira sem grafite
1 Caixinha de grafites
1 Real em moeda
1 Bilhete
1 Chaveiro de leão

No bilhete escrito:

“Má, o chaveirinho é para dar sorte e para lembrar que eu sou seu leãozinho e que sempre vou estar com você te protegendo durante as provas.
Boa sorte minha linda!
Beijos Leo”

Joguei tudo para um canto, peguei o chaveiro, cheirei tinha um perfume delicioso, algo como uma flor. Guardei na minha bolsa, e passei o final de semana de pernas para o ar. Não tive vontade nenhuma de estudar, precisava de muita nota nessa prova. Levantava, remexia a mala, nada de pegar nenhum livro ou caderno, via no fundo o chaveirinho, pegava, cheirava e guardava. Foi assim o fim do sábado e todo o domingo.

Segunda-feira sentada na carteira da sala aguardando a distribuição das provas, última olhada no meu amigo leão. Prova na carteira. Lápis na mão. Impressionante, primeiro exercício - fiz em 5 minutos, segundo exercício – Acho que não fui nessa aula, mas vamos ver o que eu sei fazer – terceiro exercício – Como era a fórmula mesmo? Lembrei. Só isso? Tão simples!Trinta minutos depois, esperando meus amigos na porta da sala para comprar os exercícios.

Sai o Denis:
- Nossa muito difícil!
Sai o Takai:
- Impossível esse professor tá loco!
Sai o Ivan:
- Ainda bem que não precisava de muito.

Resumindo, eu devia ter ido muito mal, confundido tudo, eu não podia ter achado a prova tão fácil assim sem ter estudado. Agora só me restava esperar pela a nota e me preparar para o exame.

Três dias depois, o Denis me chama de longe:

- Você viu sua nota?
- Não, muito ruim?
- Não, foi a maior nota da sala.
- Sério?
- Sério!Você tirou nove.
- Não acredito
- Vai olhar no quadro!


Fui verificar, era eu mesma, nove, exatamente o que eu precisava nada a mais, nada a menos, exatos nove. Num impulso abri minha mala beijei o chaveiro e agradeci. De agora em diante ele seria meus talismã.


Parte 3 – do fim da magia

Aquele bimestre foi excepcional, as melhores notas que eu jamais tirei. Sentada no banco do jardim aguardava à hora da última prova. Tinha a certeza que meu talismã me ajudaria como ajudou em todas as outras provas, estava tranqüila esperando, é nessa hora ouço uma conversa:

Ela – Mas Leo, o que eu fiz para você?
Ele – Má você nunca me entende, sempre me cobra estar do seu lado.
Ela – É que eu gosto tanto de você, deixo tudo para ficar com você.
Ele – Mas eu não quero que você deixe nada, quero que viva a sua vida.
Ela – Eu vivo, mas vivo melhor do seu lado!
Ele – Má eu não te amo mais, essa é a verdade. Não quero mais viver do seu lado.
Ela - Eu te amo Leo.
Ele – Meu amor passou, sinto muito.
Ele – Marina, não chore!

Ela sai correndo e chorando pelo campus.

Hora da prova, o professor entrega a prova na minha mão, mas agora sinto alguma coisa errada. Mãos suando, visão embaçada, o nervosismo como antes. Primeiro exercício – vou deixar para depois. Segundo exercício – nosso nunca vi essa matéria. Terceiro exercício – é o fim. Noventa minutos, entrego a prova, exercícios incompletos nenhum resolvido com certeza. No corredor todos dizendo que foi moleza e eu certeza de exame no fim do ano.

Sentei no banco mais uma vez e lá eu entendi. Passou o efeito, o talismã perdeu a força.

Continua